sexta-feira, 17 de setembro de 2010

INTOLERÂNCIA

Quando eu a vi, me senti atraído, que coisa linda.
A pele dela era tão bonita, era igual a minha.
Seus cabelos naturalmente cacheados chegavam à altura do ombro,
Sua boca carnuda, seu nariz redondo, seu corpo desenvolvido, que delícia, ela era maravilhosa.
Estava ali em seus traços bem definidos a personificação da África que eu tanto procurava.
Eu vi em seus olhos, lindas crianças que poderiam ser resultados da nossa união, só na imaginação.
Chamei-a para sair e me disse não, isso não me fez desistir até que veio a grande decepção, ruindo meu castelo e levando-o ao chão.
Inacreditável! Aquela princesa, linda mulher negra começou a me xingar de macaco, dizendo pra eu olhar no espelho e se continuasse a importuná-la chamaria seus amigos pra me linchar.
Olhei ao seu redor para ver quem ela chamava de amigos e não gostei do que vi, porque eram cinco filhos de papai racistas, velhos conhecidos de brigas de escola motivados pela intolerância racial.
Eles me viram sendo ofendido por àquela linda mulher que escolhi pra ser a mãe dos meus filhos, alguns empinaram o nariz outros riram eu então dei as costas e saí.
Passado um mês voltei àquela galeria e quando entrei fui direto ao box 14(informática e games) e por não tê-la visto perguntei ao cara que lá trabalha;
_ Cadê a princesa que trabalha aqui do lado?
_Qual aquela que te deu um esculacho?
_ É.
_ Ela morreu, já faz uns dias. Foi desovada no lixão com sinais de estupro e enforcamento, ao lado do corpo foi encontrado várias cápsulas de cocaína. Eu sei que ela não usava drogas, mas começou a colar com uns caras errados.
_Que caras?
_Olha, eu não sou dedo duro, mas por você ser uma pessoa legal e eu ter perdido uma colega de trabalho vou te falar.
Aquelas caras que estavam com ela aquele dia vendem drogas nas escolas no shopping e aqui na galeria também.
Não são traficantes, são filhos de papai que com o poder ilusório do branco escravizam crianças, adolescentes depois as deixam morrer.
Aquela linda mulher negra que poderia ser mãe dos meus filhos, me abandonou, se iludiu com o branco se tornou vítima do opressor.
Meu primeiro filho não nasceu, nem o segundo nem o terceiro, ficaram só na imaginação resultante da primeira vez que a vi.
Pensei em matar àqueles boys por terem acabado com meu sonho, mas esse jeito não seria o certo.
Algumas vezes fui ao shopping e trombei com eles.
No portão da escola também estavam lá, viciando crianças e adolescentes, então montei uma vigília e resolvi denunciar.
Foram presos em flagrante, mas como sabia que não ficariam por muito tempo, agi rápido mandando um papagaio pros malucos do x dizendo toda a parada que estava acontecendo aqui fora; molecada viciada só pele e osso que não freqüentava mais a escola, meninas se prostituindo e virando mães solteiras adolescentes e falei das mortes e descaminhos da ilusão provocados pelo poder branco e a cultura do embranquecimento, manifestação mais sutil e cruel de racismo, que fora adotado
e implantado nesse país sem identidade onde o opressor é invisível.
Quando a população prisional soube disso bastou, porque todos têm família e respeitam mães, filhos e filhas. O veneno seria a recepção dos boys.
Soube depois, que no mesmo dia todos os cinco boys foram liberados.
Mas não durou muito tempo, escaparam de morrer na cadeia pelo seguro, mas na rua em breve seriam finados.
O inevitável aconteceu. O que o ser humano é capaz de fazer você nem acredita.
Visivelmente foram mortos com requintes de crueldade.
Seus corpos quando encontrados tinham uma aparência bizarra, nenhum foi alvejado por arma de fogo e nenhum estava inteiro.
Alguns foram degolados outros decapitados.Com o tronco separado da cabeça estavam sem olhos e sem orelhas.
Seus pênis foram cortados e enfiado em suas próprias bocas.
No ânus de cada um foram socadas várias cápsulas de cocaína que fizeram um grande estrago com ajuda de um cabo de vassoura que foi enterrado a marteladas até a metade.
Disseram não ter sido fácil achar as pernas e braços já que foram esquartejados.
A polícia pressionada pela família queria a punição dos autores mas foi em vão, porque mesmo botando terror e apavorando a população tiveram que arquivar o caso; ninguém sabe e ninguém viu nada.
E assim a resistência permanece lutando contra o poder branco.
As marcas do passado não se apagam, as feridas não cicatrizam, sou vítima de um crime hediondo que até hoje perturba a mente, não superei esse trauma e nem quero superá-lo.
Carrego comigo a revolta no meu subconsciente.

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